Os quatro pontos da liberdade

O Número Quatro no Judaísmo
O número quatro (e seus múltiplos, como os 40 anos vagando pelo deserto) traz um significado todo especial para as celebrações judaicas.
Desde sempre o quatro fascina o ser humano: as 4 estações, os 4 elementos da Natureza, os 4 pontos cardeais, o homem vitruviano de Leonardo da Vinci (a quadratura do círculo), os 4 cantos da chupá e, só para lembrar, as quatro pontas do talit, que nos envolvem com suas franjas (tsitsit) indicando as mitzvot que precisamos cumprir...  Isso para não falar de nossas 4 matriarcas: Sara, Rebeca, Léa e Rachel.
Malba Tahan traz um intrigante desafio sobre os quatro quatros: você pode escrever qualquer número de 1 a 100, utilizando quatro quatros! Esta curiosidade, você pode conferir no livro de Malba Tahan, “O Homem que Calculava”, disponível aqui: http://www.lazzoz.xpg.com.br/Tex-O_Homem_que_Calculava.pdf 
O quatro está presente em Purim (as quatro mitzvot que devemos cumprir), em Tu BiShvat (Ano novo das árvores) com seus 4 cálices de vinho, em Sucot com suas 4 espécies, em Chanuká com os 4 lados do dreidel (pião).
Mas é Pessach... E cá estamos às voltas com o número 4 outra vez!
Confira: 4 copos de vinho, 4 crianças, 4 perguntas...
E para adicionar uma pitada de cabala, o Tetragrama (nome sagrado de Deus) possui quatro letras – o número, assim, condensa a espiritualidade e algo que finaliza – um ciclo que se completa em Pessach, da escravidão à liberdade.
Assim, nesta véspera do primeiro Seder de Pessach, hoje e amanhã durante o dia, realize uma introspeção para atingir a liberdade em seus quatro ângulos. Vamos ver estes quatro degraus.
1. Você, como o filho sábio, analisa tudo minuciosamente, colocando a razão e o intelecto acima de tudo? Na hagdá (relato)  o filho sábio não é necessariamente o filho justo. Será que ao priorizar uma analise racional você não está deixando de lado a emoção e uma visão global? Ouça também a sua intuição e deixe-se envolver por aquilo que nem sempre cabe na caixa da ciência.
2. Passe um outro nível de entendimento, que se expressa com o segundo filho. Em que situações, muitas vezes, você responde no “automático”, apenas para dar uma respostas, para contrapor uma opinião, sem nem ouvir ou perceber o que outro diz? Talvez expresse uma revolta angustiante, uma crítica que parece (como o sábio) correta. Será? Desenvolver a capacidade de empatia, colocar-se no lugar do outro (sem rapidamente cortá-lo das relações ou bloquear nas redes sociais!) é um difícil aprendizado, mas fundamental para o exercício da liberdade.
VAMOS SEGUIR EM FRENTE RUMO À LIBERDADE
Vamos seguir nossa jornada, pois os quatro aspectos estão presentes na identidade de cada pessoa. Como você lida com eles é que faz a diferença.
Até aqui como você viu que o número quatro tem toda uma simbologia especial no judaísmo... Na cabala, o número 4 está associado ao tetagrama, o nome divino, e em cada celebração o quatro aparece, como uma bússola a guiar os caminhos entre os quatro pontos cardeais. Em Pessach, que começa ao anoitecer deste dia 30 de março de 2018 (14 de Nissan de 5778) o número 4 aparece várias vezes, especialmente nas perguntas colocadas pelos quatro filhos, que representam quatro aspectos da personalidade humana ou fases do amadurecimento. Nenhuma é melhor que a outra – são reflexos de como você, cada um de nós, enfrenta diferentes situações... Algumas vezes, com uma abordagem racional, intelectual (primeiro filho). Outras, de maneira instigadora, rebelde (segundo filho). E os outros dois filhos? O que eles têm a nos ensinar?
3. O terceiro filho é aquele que vê, mas não se envolve. Você já escutou a famosa frase: “Isso não é da minha conta”? Ou suas variantes –“O responsável por isso é fulano”, “Sou estou cumprindo ordens”, “Tanto faz”, “Faça como quiser”, “Sempre foi assim...”. São aquelas situações em que você se acomoda, seja porque motivo for. Vê, escuta, mas deixa de agir, de se envolver – criticar, protestar, realizar, aginal, "em briga de marido e mulher ninguém bota a colher…" Não deve mesmo colocar? Por quê? Lembre-se: o judaísmo é uma religião de ação, como nos recorda sempre o tefelin! A liberdade exige ação, esforço, romper as barreiras da acomodação.
4. Finalmente, chegamos ao quarto filho: aquele que nem perguntar sabe... Que aspecto ele nos traz? Talvez seja o mais problemático, porque quem nem chega a perguntar, é porque perdeu totalmente a conexão como uma determinada situação. Não enxerga. Não escuta. Portanto, sequer abre a boca. Qual a situação que está ocorrendo e você não percebe?
Ouvi um depoimento impressionante de uma brasileira alemã que, estando na Alemanha, durante a 2a. Guerra Mundial, por diferentes razões acabou ficando sem possibilidade de retornar ao Brasil. Lá estava e lá ficou. E ela comentava que não sabia de nada sobre o extermínio dos judeus, que se soubesse, teria feito algo... Ela, no início, acha horrível (palavras dela) a humilhação que os judeus sofriam – a Estrela de David nas roupas, a expulsão de vários lugares. Mas aos poucos (ainda palavras dela) isto deixou de acontecer. Não se viam mais judeus pelas ruas com a Estrela de David.
Ela nunca se perguntou o porquê*.
Neste Pessach, pergunte – com sabedoria, criticamente, tolamente. Mas pergunte sempre e afirme sua liberdade.
Chag Pessach Sameach!

Para ler mais sobre os quatro filhos em Pessach, acesse esta maravilhosa matéria da Revista Morashá: http://www.morasha.com.br/pessach/os-quatro-filhos-do-seder-de-pessach.html
* O depoimento encontra-se no filme Anauê, de Zeca Pires. Nunca é demais lembrar que existem múltiplas formas de escravidão. A ignorância é uma delas.
Confira o trailer do filme.

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